Vó Tutu distribui mais de 2 mil pães diariamente. Crédito de imagem: arquivo pessoal

Na Brasilândia, bairro da zona norte da cidade de São Paulo, todos os dias o Instituto Ações Sociais Vó Tutu distribui, gratuitamente, mais de 2 mil pães. Além disso, doa alimentos e itens de higiene e organiza cursos de capacitação profissional em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), entre outras atividades. Para saber mais, Camila S., integrante do Clube do Joca de 12 anos, entrevistou a Vó Tutu, idealizadora do instituto, e Vânia da Silva, filha dela. 

O que te motivou a começar o projeto?

Vó Tutu: antes da pandemia, eu tinha montado um restaurante e era o nosso sonho. Levei quatro filhos comigo, demorei oito meses para montar (…). Dois meses depois, veio a pandemia. (…) Eu já fazia alguns trabalhos sociais, coisas esporádicas, atendendo crianças que nunca tinham feito um aniversário, um adulto que nunca tinha tido uma festa. Fiquei sem entender como a gente ia recomeçar. Estava sozinha no meu quarto e, de repente, perguntei para Deus o que fazer da minha vida (…). De repente, uma voz me disse: “Vovó, faz pão” (…). E assim foi feito. De início, fiz 200 pães. Então surgiram 20 pessoas e eu dei esses pães. Deu certinho. Depois, havia quase 50 pessoas na fila. E assim começou esse trabalho.

Antes de vocês terem o restaurante, o que vocês faziam?

Vânia: antes de abrir o restaurante nós já trabalhávamos com refeição. Fazíamos marmitex, porque a Vó Tutu trabalhava no Hospital das Clínicas [São Paulo]. E as marmitas passaram a ser uma renda a mais para ajudar na economia da casa. A Vó Tutu sempre trabalhou fazendo doces para festas, bolo, vendendo marmitex, antes de abrir o restaurante. Tudo que você imaginar de comida nós já trabalhamos para complementar a renda.


Vânia, filha de Vó Tutu. Crédito de imagem: arquivo pessoal

Quando vocês aprenderam a fazer pão? 

VT: perto da minha casa tem uma instituição, de 80 anos, que é responsável por alimentar muitas pessoas na zona norte com sopa e pão. Em uma época na minha vida, tinha passado por um acidente e estava ociosa, então resolvi fazer um curso de panificação nesse local. No começo, fiquei como aluna e depois passei a ser voluntária. O diretor me chamou, falou que eu tinha muito jeito para conversar com as pessoas e paciência. Daí me pediu para ficar, e eu fiquei quase quatro anos. Quando saí de lá, já tinha a ideia de ter algo nesse sentido, mas não tinha dinheiro.

Você imaginava que a sua ação de distribuir pães na vizinhança se tornaria esse projeto que é hoje? 

VT: eu nunca imaginei (…). Fui fazer pão porque, como uma mulher negra e de periferia, eu conheço as dores das pessoas porque são as minhas também. A diferença da Vó Tutu em relação às pessoas que recebem o pão é que eu estou do lado de quem está fazendo pão e, elas, recebendo. Eu vivo as mesmas necessidades que elas. (…) Acho que nenhuma família, mãe nenhuma, pai nenhum, tinha que estar numa fila para pegar pão. É uma coisa tão simples, feita com água, farinha, sal e fermento. É desumano. Então eu acho que foi a dor, a minha experiência de vida. Foi algo como: “Vai, mulher, agora é sua vez de retribuir aquilo que um dia alguém te deu”. A gente não esperava. Agradeço a Deus todos os dias. Não pela fila, pois é muito triste, e sim porque sei que uma hora essa fila vai acabar.

Que conselho você daria a quem quer ajudar o próximo e não sabe por onde começar?

VT: sem medo de errar, às vezes a vovó usa esta frase: “Ninguém é tão pobre que não possa ajudar, porque ajuda não vem só de coisas materiais, vem de um abraço, de você ter um minutinho do seu tempo para ouvir aquilo que a pessoa quer falar”. Isso é o principal, porque, quando você permite que a pessoa se comunique, consegue entender pelo que o outro está passando. A maior doação é essa, mostrar que nós somos todos iguais. Temos que ter a consciência de que não podemos colaborar apenas com coisas palpáveis — até no silêncio às vezes você ajuda. 

Quais são os maiores desafios que vocês enfrentam no trabalho?

 Vânia: os nossos maiores desafios são manter as doações e conseguir conscientizar aquelas pessoas que estão lá diariamente a aderir às oportunidades que compartilhamos. Hoje nós oferecemos cursos, só que, muitas vezes, as pessoas não estão acostumadas, principalmente quando são possibilidades gratuitas. Então o nosso desafio é mostrar para elas que há várias chances e meios pelos quais podem conseguir, gratuitamente, qualificar-se, melhorar a vida. É uma conversa diária.

Camila S., 12 anos

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