O QUE ACONTECEU DURANTE O JOGO? 
No dia 21 de maio, durante uma partida entre Real Madrid e Valencia, no estádio de Mestalla, Espanha, os torcedores do Valencia começaram a gritar insultos racistas como mono (macaco em espanhol) contra o jogador brasileiro negro Vinícius Júnior. 

Aos 72 minutos, Vini Jr. confrontou os torcedores e o jogo foi interrompido. O locutor do estádio precisou pedir que as ofensas parassem ou a partida seria cancelada. 

Mais tarde, durante os acréscimos, aconteceu um novo tumulto quando o goleiro do time rival, Mamardashvili, voltou a provocar o jogador (não se sabe ao certo o que ele disse). A confusão terminou com apenas Vini expulso, ao receber um cartão vermelho. 

Dois dias depois, o cartão foi anulado, pois concluíram que o profissional responsável por operar o VAR (análise das jogadas em vídeo) não mostrara ao juiz tudo o que havia ocorrido, como o fato de Vini Jr. ter sido fisicamente agredido por outro jogador antes de reagir. 

Os acontecimentos dessa partida chamaram a atenção de todo o mundo para o racismo no futebol. 

#pracegover: Vini Jr., que veste a camiseta do time em tons de roxo, reage ao racismo sofrido durante partida. Ele está acompanhado de colegas. Credito de imagem: Aitor Alcalde/Getty Images

PÓS-PARTIDA 
A Comissão de Recursos da Federação Espanhola penalizou o Valencia com multa de 27 mil euros (cerca de 145 mil reais). Além disso, uma parte dos assentos do estádio que pertence ao time ficará indisponível por dois jogos. 

Dois dias depois da partida, sete suspeitos de racismo contra Vini Jr. foram presos pela polícia espanhola. Três deles acabaram soltos depois de prestar depoimento. As investigações continuam. 

As duas equipes se pronunciaram oficialmente sobre o que ocorreu no dia 21 de maio. O time adversário ao de Vini declarou: “O Valencia CF já procedeu à abertura de processo disciplinar, aplicará a máxima severidade contra os envolvidos, expulsando-os do estádio para sempre, e colabora com a polícia e as autoridades competentes para esclarecer o sucedido”. 

Já a equipe do brasileiro disse: “O Real Madrid CF manifesta a sua mais forte repulsa e condena os acontecimentos de ontem contra o nosso jogador Vinícius Júnior. Esses fatos constituem um ataque direto ao modelo de convivência de nosso Estado social e democrático de direito”. 

AS NAÇÕES SE PRONUNCIAM 
Os governos de Espanha e Brasil também se posicionaram. “O governo repudia os racismos que Vini Jr. vem sofrendo nos jogos da Espanha e insta as autoridades governamentais e esportivas, da Espanha e do mundo, a tomar providências para punir os criminosos e evitar que atos assim, bem como qualquer tipo de discriminação, se repitam”, declarou o governo federal do Brasil. 

“Condenamos de maneira enérgica os insultos racistas ocorridos no âmbito do futebol. Esses incidentes são intoleráveis e absolutamente condenáveis, não apenas no espaço esportivo, como em toda a Espanha, terra de acolhimento e que faz da diversidade sua bandeira”, afirmaram as autoridades espanholas. 

SOLIDARIEDADE BRASILEIRA 
No fim de semana seguinte ao mais recente ataque racista a Vini Jr., houve diversas manifestações de apoio durante partidas de futebol no Brasil. Em 27 de maio, o Flamengo, por exemplo, entrou em campo com a frase “Todos com Vini Jr.” na camisa. 

A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) organizou uma ação chamada “Com racismo não tem jogo”. A frase foi estampada nas faixas dos capitães dos times, bolas, moedas utilizadas pelos árbitros e placas de publicidade ao redor do campo. Além disso, foi gravado um vídeo sobre o assunto para ser exibido nos telões do estádio. 

#pracegover: durante partida entre Cruzeiro e Flamengo, os dois times se posicionam no meio do campo com faixa em que está escrito: “Com racismo não tem jogo”. Credito de imagem: Meier/Getty Images

HISTÓRICO DOS ATAQUES RACISTAS 
Desde 2021, foram abertas dez denúncias na Justiça espanhola para casos de ataques racistas contra Vini Jr. na LaLiga. Destas, três foram arquivadas. As outras seguem em acompanhamento na Justiça. 

Ocorridos dentro e fora de campo, os ataques se deram em diferentes jogos do campeonato espanhol. O primeiro foi em outubro de 2021, em partida entre Real Madrid e Barcelona, quando gritos de “macaco” foram entoados por torcedores — este foi um dos processos arquivados. 

Em diversas denúncias, os culpados não foram identificados pela Justiça espanhola. Quando houve identificação (nos fatos ocorridos antes de 21 de maio), as pessoas receberam multas, tiveram a carteira de sócio-torcedor suspensa e perderam ingressos para partidas. 

O que acontece com Vini Jr. não é uma situação isolada. Outros exemplos são: em 2011, durante um jogo amistoso entre Brasil e Escócia, um torcedor jogou casca de banana em direção a Neymar Jr.; em 2022, em amistoso entre Brasil e Tunísia, uma banana foi atirada em campo após um gol de Richarlison. 

No Brasil, em 2014, o goleiro Mário Lúcio Duarte Costa, conhecido como Aranha, na época, do Santos, foi chamado de macaco por torcedores do Grêmio. De acordo com o último relatório do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, o ano de 2021 registrou 51 casos de racismo em estádios brasileiros. 

O RACISMO E O ANTIRRACISMO 
De acordo com o Portal Geledés, do Geledés Instituto da Mulher Negra, racismo é um conjunto de práticas de determinada raça/etnia que, estando em situação de favorecimento social, coloca outra(s) raça(s) em situação desfavorável. O racismo acontece, por exemplo, contra negros e contra indígenas, e é crime no Brasil. 

Atualmente, diversas iniciativas falam também de como é fundamental manter uma postura antirracista, com ações ativas de oposição ao racismo. Um projeto desse gênero vem do próprio Vini Jr., por meio de seu instituto. Criado em 2021, o Instituto Vini Jr. atua, entre outros pontos, com o antirracismo nas escolas. Desenvolvido em parceira com o professor Allan de Souza, o projeto, criado há quatro meses, já chegou a dois colégios públicos da cidade do Rio de Janeiro, com oficinas para formar professores sobre, por exemplo, a importância de existir uma educação antirracista. O objetivo é expandir a atuação para mais locais. 

“O Meu Cabelo É Bem Bonito” 
Allan de Souza, conhecido também como Pevirguladez, é um professor e rapper carioca que viralizou nas redes sociais, em agosto de 2022, com um vídeo em que aparece cantando a música antirracista “O Meu Cabelo É Bem Bonito”, de própria autoria, com seus alunos. “Vejo a música como uma ferramenta de grande importância com os estudantes. No ano passado, veio a circunstância de trabalhar música de maneira antirracista com as crianças”, disse Allan ao Joca

Por meio de canções, o professor reforça a importância de que o tema seja tratado com pessoas de todas as idades. “A música tem um poder único no imaginário humano. Versos como ‘Deixe de bobagem, pretinho, quem foi que disse que você não é lindo?’ vão ficar com a criança durante toda a vida e fazer com que ela recorra a esse tipo de pensamento quando for atravessada por uma situação racista”, explicou. “Quando se tem noção de que o seu cabelo e nariz são bonitos, de que não há nada de errado, a reação é muito melhor do que quando não existe um trabalho nesse sentido.” 

As ações de Allan em sala de aula se tornaram um show, que atualmente percorre escolas públicas no Rio de Janeiro. “O Meu Cabelo É Bem Bonito Tour promove a mensagem de que o antirracismo salva, o antirracismo cura. Devemos trabalhar isso na base, com as crianças, para ter uma geração, lá na frente, mais saudável na nossa sociedade”, conclui. 

O CLUBE DO JOCA PERGUNTA
Integrantes da terceira turma do clube trouxeram questões para o professor Allan responder: 

COMO SE CONSCIENTIZAR PARA O ANTIRRACISMO? 
Segundo ele, algumas maneiras são: 

• Conhecer personagens e histórias do povo negro sem ser pela escravização (que fortalece o imaginário negativo, com os negros acorrentados, por exemplo). 

• Mostrar que os negros também são descendentes de reis e rainhas, da África. 

  • Saber que a cultura negra é importante para todo o desenvolvimento e a identidade do Brasil. 

POR QUE AINDA EXISTE RACISMO? 
“Essa é uma herança escravocrata, com mais de 400 anos, e a sociedade brasileira vem atuando há pouquíssimo tempo para combater o racismo de forma eficaz. Ainda vamos precisar de muitos debates e da construção de muitas coisas para eliminá-lo do país. Vai demorar um bocado para haver uma geração em que o racismo não se faça presente”, afirma Allan. 

Fontes: BBC, Estadão, Folha de S.Paulo, G1, Metrópoles, O Globo, O Lance, Terra e UOL.  Fontes: Agência Brasil, canal do jornalista esportivo Marcelo Bechler, GE e Observatório da Discriminação Racial no Futebol. 

Esta matéria foi originalmente publicada na edição 207 do jornal Joca.

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