Conheça o projeto do Parque Minhocão e seus desafios.
por Martina Medina
No dia 21 de fevereiro, a prefeitura da cidade de São Paulo anunciou a criação de um parque em parte do Elevado Presidente João Goulart, viaduto mais conhecido como Minhocão. O projeto deve custar 38 milhões de reais e ficar pronto até dezembro de 2020.
Inicialmente, o parque ocupará 900 metros dos 3,4 quilômetros da via. A previsão é preencher 17.500 metros quadrados (área equivalente a quase três campos de futebol) com jardins, bancos e estruturas de bambu para fornecer sombra e descanso. As árvores devem garantir mais privacidade aos moradores dos edifícios cujas janelas têm vista para o Minhocão.
Também devem ser construídos nove acessos para pedestres, ligações com prédios e parques vizinhos com escadas e passarelas, uma ciclovia e estruturas de proteção nas laterais do viaduto. Na parte de baixo, onde ficam as avenidas Amaral Gurgel e São João, a proposta é abrir buracos no Minhocão para iluminar a área, que hoje é bastante escura e apresenta goteiras.
Uma das referências do projeto para o Minhocão é o High Line, parque criado em uma ferrovia danificada de Nova York, nos Estados Unidos.
CORRESPONDENTE INTERNACIONAL
“O High Line foi transformador para a história recente de Nova York. Sua conclusão, em 2014, marcou uma abordagem nova de design urbano para as cidades mais modernas dos Estados Unidos e a mudança do Chelsea em um bairro jovem e moderno. Antes do desenvolvimento do High Line, os planejadores urbanos de Nova York tentavam espremer áreas verdes em superfícies já muito ocupadas. Essa faixa de verde em um mar de cinza e azul mostrou que pedaços caros de terra não são um pré-requisito para criar espaços verdes em uma cidade.
Desde a construção do High Line, mais e mais jardins de cobertura, projetos de jardinagem comunitária e com foco em vegetação começaram a se espalhar por Nova York. Os trilhos, que antes afastavam os moradores e atraíam pombos, tornaram-se o coração do Chelsea. Empresas locais tiveram aumento saudável de clientes após a inauguração do High Line, especialmente os restaurantes. Pessoas de todo o mundo visitam o bairro para ver as paisagens do parque, sentir o cheiro das flores na primavera e depois explorar o que o Chelsea tem para oferecer. Ao mesmo tempo, os moradores ainda podem encontrar paz e tranquilidade em um enorme espaço verde, sem ter que se aventurar no Central Park. O High Line é o que conecta muitos nova-iorquinos à terra abaixo deles, sem ser construído diretamente sobre ela”, Mathius G., de 15 anos, morador de Nova York.
“O High Line impactou o Chelsea de maneira positiva e negativa. O projeto, concluído em 2014, foi realmente inovador e criativo. Nenhuma outra cidade do mundo na época tinha sua própria versão do High Line, e a novidade atraiu ainda mais turistas. Enquanto as pessoas vinham de todo o mundo para ver a nova atração principal de Nova York, homens de negócios começaram a enxergar as oportunidades econômicas que o High Line havia trazido ao Chelsea. Novos edifícios, lojas e restaurantes se espalharam ao longo do parque, e novos moradores passaram a viver no bairro e o transformaram em algo completamente diferente do que era antes. O custo de vida aumentou para os residentes antigos, tornando mais difícil a sobrevivência deles ali. Os restaurantes e lojas em que cresceram foram demolidos e substituídos por outros, mais modernos e caros. Além disso, casas e prédios antigos foram derrubados para a construção de grandes arranha-céus projetados para abrigar centenas de novos moradores. Embora o High Line tenha ajudado a atrair novos residentes ao Chelsea, afetou negativamente os mais antigos”, Chetan C., de 17 anos, que também vive em Nova York.
A HISTÓRIA DO MINHOCÃO Inaugurado em 1971 para melhorar o trânsito na região central e conectar as zonas oeste e leste da cidade, o então Elevado Presidente Costa e Silva foi criticado por moradores por trazer barulho e poluição. Cinco anos depois, a circulação de veículos foi proibida da meia-noite às 5h. Em 1989, os carros foram vetados entre 21h30 e 6h30. Em 1996, a via foi fechada para automóveis aos domingos e feriados, tornando-se uma área de lazer nesses dias. Há cinco anos, uma lei determinou que o Minhocão fosse destruído ou usado de outra forma. Em 2015, o Parque Minhocão foi aprovado pela Câmara Municipal de São Paulo.
DESAFIOS O parque promete trazer mais áreas verdes, ser um espaço seguro para brincar e se exercitar e garantir menos barulho para a população que frequenta e mora na região. Mas também pode aumentar o custo de viver por ali e dificultar o trânsito.
IMÓVEIS MAIS CAROS A transformação do viaduto em parque deixa a região mais agradável para morar, o que a valoriza. Com esse argumento, os donos de imóveis aumentam os preços de casas e apartamentos, fazendo com que alguns moradores e comerciantes não consigam pagar o aluguel e sejam obrigados a deixar a região — processo conhecido como gentrificação. Segundo especialistas, uma maneira de impedir que isso aconteça é congelar o preço de parte dos imóveis para garantir a permanência de antigos moradores de baixa renda.
TRÂNSITO Atualmente, cerca de 78 mil carros passam pelo Minhocão todos os dias. Enquanto alguns estudos dizem que impedir a circulação de automóveis pelo viaduto não vai causar mais trânsito, outros declaram o contrário. Para urbanistas e arquitetos, é necessário criar e testar alternativas para impedir congestionamentos.
SEGURANÇA Como o viaduto foi construído para a circulação de carros, não há garantias de que comporte o peso de árvores e pessoas. Também faltam saídas de emergência para que pedestres possam escapar em caso de incêndio ou outra emergência. Especialistas defendem a realização de estudos e obras que adaptem a segurança do espaço para esse novo uso.
PARTICIPAÇÃO Para os especialistas, é necessário que a prefeitura consulte os moradores para definir como o parque será e encontrar soluções para seus desafios. Segundo a prefeitura, a população será consultada durante a construção.
Especialistas consultados: arquiteto Paulo von Poser, membro da Associação Amigos do Parque Minhocão; coordenador e gestor de projetos da Rede Nossa São Paulo, Américo Sampaio; e Fernando Túlio, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil São Paulo (IAB SP).
Reportagem publicada originalmente na edição 127 do jornal Joca.
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