Alexandre Ramos é educador físico e trabalha na rede pública municipal de ensino de São Paulo (SP). Há mais de 30 anos, lidera o projeto Ursos Basquetebol, um time de basquete que ensina o esporte para crianças, adolescentes e jovens de São Miguel Paulista, periferia na zona leste da cidade. Sophia A., 14 anos, integrante da quarta turma do Clube do Joca, conversou com o treinador para saber mais sobre o trabalho dele com o Ursos.

#pracegover: Alexandre está em pé, usando roupas azuis e conversando com os meninos jogadores do time, que estão sentados lado a lado na quadra. Ao fundo, há diversas árvores. Crédito de imagem: arquivo pessoal

Como o time começou? 

Em 1987, eu estava assistindo à final [de basquete masculino] dos Jogos Pan-americanos de Indianápolis, quando o Brasil foi a primeira equipe a bater os Estados Unidos dentro de casa — eu me apaixonei pelo esporte. Em 1990, estava no ensino médio na Escola Estadual Dom Pedro I, em São Paulo (SP), quando um grupo de alunos me procurou, porque sabia que eu jogava basquete e queria que o preparasse para o torneio interclasses. Aceitei a proposta e faço isso até hoje. Depois, montamos um projetinho mesmo, utilizando a quadra da escola no fim de semana. Agora, o Ursos já completou 33 anos. Até 1998, fiquei nas escolas públicas estaduais; de lá para cá, entrei na rede pública municipal.

Tem algum tipo de processo seletivo ou características necessárias para participar do time? 

Não, a única expectativa é de que gostem de basquete ou tenham interesse em jogar. Aí é aberto: quem vem participa.

#pracegover: Alexandre está sentado no meio da quadra e sorrindo. Ele veste moletom azul-marinho, vermelho e branco. No rosto, usa óculos de grau. Ao fundo, há outras pessoas. Crédito de imagem: arquivo pessoal

Em um vídeo a que assisti sobre o projeto, vi que no time só tinha jogadores. Tem um time feminino? 

É aberto para meninas, sim. Inclusive, agora, tem algumas em atividade com a gente, dos 12 anos até a equipe adulta feminina (…). Atletas mirins foram crescendo, organizam-se e disputam torneios carregando o nome da equipe.

É muito difícil arrecadar dinheiro para os gastos do time? 

Fazemos com o apoio dos pais, amigos e atletas já adultos que participam. Existe uma festa junina local, em que temos a Barraca dos Ursos, que vende um cachorro-quente bem caprichado. A nossa renda gira em torno dessa festa e de rifas. Às vezes, tem algum pai que pode apoiar com algo, de repente uma bola ou uniforme.

Qual a importância desse projeto para os alunos? 

Existe uma melhoria no comportamento deles, porque, afinal, é um esporte que envolve regras necessárias para o desenrolar da prática do basquetebol. Com isso, percebemos que os estudantes vão melhorando o comportamento e o desenvolvimento cognitivo [relativo à aprendizagem]. A prática esportiva ajuda nisso, é um exercício difícil, faz bem para a mente e o corpo.

Algum participante já virou jogador profissional? 

Atualmente, temos a Kerolene Araújo, que já jogou pela Seleção Brasileira Sub-15. Ela fez o ensino médio em Nebraska [Estados Unidos], onde ganhou bolsa para jogar basquete. (…) Hoje ela faz arquitetura e joga pela Universidade do Texas [EUA]. Tem também o Alexsander Vernizzi, que está com 23 anos, joga no Vasco, no Rio de Janeiro (RJ), e compete no torneio Novo Basquete Brasil (NBB). E o Rafael Rachel, que passou um tempo aqui com a gente (…), participou do projeto e chegou a defender o Flamengo. Tem outros também que jogaram em clubes (…).

Qual a maior dificuldade que cada um enfrenta dentro da quadra? 

Cada indivíduo é uma história. Por trás de cada atleta — criança, adolescente e jovem — existem dificuldades além da quadra. Às vezes, ela serve até como um meio terapêutico para eles. Lá os praticantes estão à vontade e se sentem acolhidos. Dentro das superações que encontram no basquete, vão aprendendo a lidar com as questões da vida também: as frustrações, os medos e a ansiedade. Tem aquela história antiga: “Basquete é para gente alta”. Aqui, nós temos um lema completamente diferente: “Basquete tem a ver com inteligência”. E aí não importa se o atleta é alto, baixo, rápido ou não. Ele vai se adaptar e oferecer o melhor (…) dentro daquilo que faz de melhor. Às vezes, o jogador pode não ser tão rápido, mas tem um ótimo arremesso de longa distância. Então, ele vai oferecer esse arremesso para a equipe. E na vida é assim: quando a gente entra em um ambiente de trabalho ou convive em família, oferece nosso melhor para o bem comum.

#pracegover: Sophia A., 14 anos, está sorrindo para a foto. Ela usa cabelos presos, camiseta branca e brincos de argola prateados na orelha. Crédito de imagem: arquivo pessoal

Esta matéria foi originalmente publicada na edição 219 do jornal Joca.

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