por Martina Medina

No Dia Mundial dos Refugiados, celebrado em 20 de junho, conheça cinco crianças de alguns dos países com maior presença no Brasil quando o tema é refúgio. O Joca conversou com jovens da Síria, República Democrática do Congo, Palestina, Angola e Venezuela para saber por que eles deixaram seu país de origem e como vivem agora no Brasil. Confira abaixo. Para ver o perfil completo, clique no nome de cada criança.

Avril D., 10 anos, venezuelana
Origem: Maturin (Venezuela)
Destino: Boa Vista (Roraima)
“Eu vim com meus pais e meu irmão da Venezuela até Roraima de ônibus, quando tinha oito anos. No meio do caminho, os policiais pararam o ônibus para revistar nossas coisas. Eu estava dormindo tão gostoso e eles me acordaram. Foi a única coisa que não gostei da viagem, que foi muito legal e bonita.
Na Venezuela faltava comida. Minha mãe não aguentava mais, ela queria comer e me dar leite, porque eu era bebê, mas não era sempre que conseguia. Havia gente morrendo de fome nas ruas. Quando a gente saía de casa, os ladrões do tráfico de drogas podiam pegar a gente. Era muito perigoso e eu tinha muito medo. A escola lá também era ruim. Não havia professores bons como aqui, nem merenda.
Meu avô venezuelano chegou há três semanas no Brasil, bem na hora do almoço. Quando ele viu a mesa posta, perguntou se aquela comida era para a semana toda. A gente falou que era só o almoço para a nossa família de cinco pessoas e ele ficou emocionado. Lá, ele comia muito pouco e não havia café da manhã – só almoço e janta.
Eu luto Karatê desde os 4 anos. Esse esporte é muito popular na Venezuela – há escolas a cada esquina. No Brasil é mais futebol, mas eu consegui uma bolsa para praticar aqui e já ganhei muitas medalhas – tenho umas 60 no total. Em julho vou para o Rio de Janeiro com meu técnico competir. Viram que eu era muito boa lutando e me chamaram.
Continuo falando espanhol, mas me enrolo todinha. Falo mais português, é mais fácil para mim.
Não sinto falta da Venezuela, só de parte da minha família que ainda está lá, como a minha tia. Se já era difícil há dois anos quando eu morava lá, imagina agora que a crise está muito pior!
Não sinto falta dos meus amigos de lá porque aqui fiz muita amizade. Eu tenho muitos amigos brasileiros e cinco ou seis venezuelanos. A gente vai para a escola e brinca todo dia! Eu gosto daqui porque tem mais vida e comida. A única coisa que eu não gosto é que em Boa Vista não tem muita calçada com asfalto. Quero continuar morando no Brasil e mudar um dia para Santa Catarina porque eu gosto muito do frio.”

Gawa W., 10 anos, palestina-síria
Origem: Lattakia (Síria)
Destino: São Paulo (SP)
“Estou acompanhando a Copa e torcendo pelo Brasil. Eu gosto de tudo aqui. Adoro comer arroz e feijão e continuo saboreando meus pratos árabes preferidos, como charuto de uva.
Minha família é palestina, mas se refugiou na Síria, onde eu nasci. Por causa da guerra, nós tivemos que sair de lá. Eu vim com a minha mãe, meu pai e meus três irmãos de avião quando eu tinha 5 anos. Foi uma viagem muito longa. Fomos embora no comecinho da guerra, agora está muito pior. Minha avó ficou lá, mas quase não consigo falar com ela.
Na Síria, eu estudava à tarde e minha matéria preferida era árabe. Eu brincava muito na rua com as minhas amigas. Aqui mudou um pouco: estudo de manhã e já não brinco na rua porque tem muito carro, então fico mais no celular. São Paulo é maior, tem muita avenida. Na Síria era mais tranquilo.
Como a minha escola no Brasil é islâmica, continuo estudando árabe. Além de brasileiros com pais árabes, tenho amigos libaneses e sírios. Da Síria, sinto falta das minhas amigas e da minha escola. Se a guerra acabar, podemos voltar.
Lá, a gente vivia em uma casa grande, com jardim e muitos quartos – quase toda minha família morava na mesma casa. Aqui, nossa casa tem menos quartos e não tem jardim.”

Celina M., 16 anos, congolesa
Origem: Kinshasa (Congo)
Destino: São Paulo (SP)
“Só quem tem dinheiro pode estudar no Congo. Então muitos jovens ficam o dia todo em casa sem fazer nada. Meu pai buscava dinheiro para pagar a minha escola, então eu estudava. Mas aqui é melhor: estudo sem pagar e tem comida na escola.
Meu irmão mais velho veio primeiro para cá. Conversei com os meus pais e eles me deixaram vir também porque a vida no Congo é muito difícil com a guerra. Estamos tentando conseguir dinheiro para trazer meus pais e meu outro irmão que continuam lá.
Eu estou feliz no Brasil mas não sei como minha família está no Congo. Não é todo dia que consigo falar com eles porque nem sempre eles têm dinheiro para comprar crédito. Quando falo com a minha mãe, ela me diz para eu não ler as notícias senão eu vou ficar muito triste com o que está acontecendo. Ela fala também para eu ficar calma que Deus vai fazer milagre para a guerra acabar. Mas mesmo que ela não fale nada, a gente vê todos dias as mortes. É muito triste.
Eu vim sozinha no avião com 13 anos. As moças me ajudaram porque eu sou criança e não falava nada de português quando cheguei.
Quando terminar os estudos, quero continuar aqui. Posso voltar para o Congo para ver minha família, mas nunca mais quero morar lá. Lá não tem muito trabalho. Se Deus quiser vou conseguir uma bolsa para fazer Medicina no Brasil e trabalhar aqui.

Riad A., 16 anos, sírio
Origem: Damasco (Síria)
Destino: São Paulo (SP)
“Confundiram o nome do meu pai com o de um criminoso e ele ficou preso na Síria durante três meses e meio. Depois, tivemos que ir para o Líbano e a única opção de refúgio de lá era o Brasil. Eu sempre gostei muito de viajar e já tinha saído do país algumas vezes, então a viagem de 30 horas foi tranquila.
Na Síria a gente tinha um alto padrão de vida: casa própria grande, meu pai trabalhava como engenheiro e nem eu, minha mãe ou meus irmãos tínhamos que trabalhar. Eu estudava em escola pública, que lá é ótima. Aqui tenho bolsa para estudar em uma escola particular, temos que pagar aluguel em uma casa menor e ajudar meus pais no trabalho com comidas sírias. A maioria das comidas que eu gosto de lá a gente faz aqui. O brigadeiro é o prato brasileiro que eu mais gosto, é a melhor coisa do Brasil.
A cultura brasileira muito diferente da síria. Minha adaptação foi difícil, mas agora está melhor. Hoje eu tenho mais amigos, mas não muitos. Amizade de verdade é difícil de fazer.
Para mim, voltar para a Síria seria difícil porque eu teria que passar por outra adaptação lá. São Paulo é um bom lugar. Quero terminar meus estudos no Brasil e me formar em engenharia mecânica, como o meu pai, porque eu gosto e sou bom em matemática.”

Vânia Sofia G., 16 anos, angolana
Origem: Luanda (Angola)
Destino: São Paulo (SP)
“Onde eu morava na Angola era muito perigoso, havia muita bandidagem na rua, como no Brasil. Mas lá, a pessoa vai se estragando. Muitas amigas minhas estavam saindo com gente que não era legal. Eu fugi porque não queria me tornar alguém diferente do que eu sou.
Eu sempre quis ser cantora, modelo e atriz, então vim buscar uma oportunidade no Brasil. Estou no segundo ano do ensino médio em uma escola estadual e quero fazer um curso de teatro para realizar o meu sonho. Trabalhei com vendas em telemarketing no Brasil, mas era um trabalho muito ruim, então saí. Como a vida é devagar, estou esperando e buscando outro emprego. Há pouco emprego no Brasil agora e a gente tem que se virar com o que aparece. O Brasil tem muitas oportunidades mas é difícil chegar lá.
Meu irmão já morava aqui com a mulher e me convidou para vir. Minha mãe me apoiou e assinou o documento para que eu pudesse vir de avião para São Paulo. Uma organização pagou minha viagem. Eu vim e decidi ficar. Ele foi embora para a França e minha outra irmã chegou em janeiro. Ela mora com uma amiga no bairro Santana e eu em um abrigo em Itaquera, na zona leste de São Paulo.
Sempre fui fã do Brasil, mas quando cheguei não aconteceu só coisa boa. Não foi fácil chegar em um país onde não conhecia ninguém e construir tudo de novo. Até agora não refiz minha vida no Brasil. Na Angola tinha amiga que eu confiava, aqui é tudo novo. Ainda tenho que saber em quem confiar e como.
Aqui, o atendimento nos hospitais é demorado e a escola do Estado não é muito boa. Muito aluno no Brasil termina o ano sem saber o que aprendeu porque só tem apostila para ler. Na Angola, a escola é mais difícil: todo mundo estuda porque a matéria ensinada em um dia cai em provas e exercícios no dia seguinte.
No Brasil também existe muito preconceito. No metrô ou ônibus já aconteceu de eu sentar do lado de uma pessoa e ela se levantar. Algumas pessoas se acham muito finas. Também teve uma colega negra que não gostava de mim na escola. Eu tive vontade de bater nela, mas só disse o seguinte: ‘eu só não bato em você porque também sou negra e africana’. Eu nem ligo se não gostam de mim ou têm preconceito. Cada um na sua. Eu sou assim, minha cor de pele é essa, essa é a minha vida e não vou mudar.”

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Comentários (10)

  • Ana Caroline Ferreira dos Santos

    2 anos atrás

    Muito legal e bonito

  • amanda

    2 anos atrás

    aaaaaaaaaaaaaaaaaaadddddddddddddddddddddoooooooooooooooooooooooooooooorrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrreeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii

  • amanda

    2 anos atrás

    amei

  • amanda

    2 anos atrás

    nossa que eles possam ficar bem

  • asoares@sidarta.org.br

    2 anos atrás

    Congo e República democrática do Congo São países diferentes. Há um erro no texto

  • Charles Henrique

    3 anos atrás

    muito bom saber das outras pessoas afinal, precisamos do nosso destino!

  • AAliAlice

    3 anos atrás

    Muito bom!!!!

  • luiza kazandjian barros de sousa

    3 anos atrás

    interessante e legal

  • pedro pereira

    3 anos atrás

    espero que eles estejam bem

  • Laura Sousa

    5 anos atrás

    Tomara que todos e suas famílias fiquem bem!!!

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